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Raúl Pires raul.pires@entroncamentoonline.pt

Já não há grande dúvida de que assistimos à dissolução da fé cristã e, mesmo que seja parcial, já será atormentador para os crentes. Razões? Muitas!

Desde logo, a Igreja Católica não se soube preparar para os tempos modernos. Deixou-se enclausurar por um mundo que, durante toda a Idade Média, viveu em contracção. Com efeito, as pessoas tinham que lutar, diariamente, pela sua sobrevivência e dos seus descendentes. À vida, sempre difícil, restava a esperança num além melhor. Assim, a Igreja, com os seus teólogos e padres, não fez mais do que justificar a existência do quotidiano. A crença numa vida melhor após a morte justificava a aceitação da ordem das coisas terrestres de que não podia escapar.

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O cristianismo repele e condena os prazeres do sensível. O orgulho, a vaidade, a luxúria, o gozo e a sede de poder, a sexualidade, entre outros vícios do sensível, são considerados pecados. São pecados da carne, mas também do orgulho. Adão, ao comer a maçã, julgou ter direito a fazê-lo, condenando-nos, desse modo, à queda. Após a queda, faça-se o que se fizer, seremos sempre pecadores. Somos pecadores porque somos orgulhosos, vaidosos; procuramos o prazer, o poder e a acumulação de bens materiais.

Porém, a partir do século dezasseis, a natureza humana é objecto de outras interpretações. Desde Maquiavel a Freud, a visão da pessoa humana modifica-se, marcando para sempre a cultura ocidental. As paixões humanas consideradas pecado pela Igreja vão ser reabilitadas e em parte legitimadas, esvaziando, assim, o mito do pecado original.

É o despertar da sexualidade com Freud. São Tomás de Aquino considerava o empréstimo a juros como pecado. Adam Smith defende a legitimidade em querer enriquecer e acumular bens materiais. A paixão política ganha foros de cidadania, o homem pode-se compreender a partir de si próprio sem ter de passar por Deus e a realidade humana pode reflectir-se sem que tenha ainda que se referir ao acontecimento mítico da Queda.

A verdade é que a Igreja Católica não acompanhou a sociedade nas suas transformações e ficou refém das atitudes míticas e dos comportamentos rituais nos quais assenta a sua ideologia.

Mas, embora a Igreja Católica defina o bom cristão como aquele que faz votos de humildade, pobreza e castidade, o facto é que alguns dos seus membros são arrastados pelas novas mentalidades. Digamos que estes membros vivem um cristianismo sem Cristo, na medida em que são vaidosos, materialistas, orgulhosos, mentirosos e, o mais repugnante, pedófilos. Isto não é ser cristão. Isto nada tem a ver com Jesus Cristo.

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