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João Fanha Vieira joao.vieira@entroncamentoonline.pt

Gabinete do Avaliador, que recebe o avaliado na sequência do Sistema Integrado de Gestão e Desempenho na Administração Pública (SIADAP):

– Boa tarde, Silva! Então, bem-disposto?

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– Vai-se andando, Sr. Doutor… Isto está cada vez mais difícil…

– Pois, parece que sim. Mas estamos aqui para melhorarmos as coisas. Vamos, então ao que interessa: o Conselho Coordenador da Avaliação (CCA) reuniu e deliberou que existem dois objetivos transversais a todos os serviços e que são os seguintes:

Um: Redução da taxa de absentismo para o ciclo avaliativo 2019-2020.

Dois: Apresentar por escrito, até 31/12/2020, 1 a 3 propostas de melhoria consideradas exequíveis, que incidem sobre métodos e organização de trabalho. Estás a acompanhar-me, Silva?

– Penso que sim, Sr. Doutor…

– Ainda bem! Vamos, então, começar pelo ponto um: as ausências!

Após a leitura dos diversos tipos de ausências não contabilizadas para o absentismo, o Sr. Silva atreve-se a colocar algumas questões sobre as faltas que descontam na avaliação:

– Ó Sr. Doutor, mas então, se eu for a uma consulta tenho falta?

– Se estiver devidamente justificada é claro que não tens falta! Desconta é na tua avaliação… Se conseguires a consulta a um sábado ou a um domingo estás safo. Já não desconta, percebes?

– Mais ou menos… Sabe, eu e a minha Maria estamos de casamento! Com esta coisa das faltas ainda tenho dias para gozar, não tenho?

– Claro que tens! Mas cada dia que passe, desconta na tua avaliação.

– Estava a pensar que era um direito que tínhamos…

– E têm, só que desconta na avaliação.

– Ó Sr. Doutor, começo a ficar preocupado com esses descontos todos. O meu paizinho está muito mal de saúde, coitadito. Não temos grandes esperanças… É claro que terei direito a alguns dias quando esse dia maldito vier?

– Claro Silva, mas se gozares todos os dias a que tens direito, já sabes, desconta-te na avaliação…

– Estou a ficar muito confuso! Então, este ano parti um pé por causa duma empilhadora e não era eu quem a estava a conduzir, era o aselha do Alberto e estive em repouso três semanas, também me descontaram esses dias na avaliação?

– Foram descontados, claro. Deverias saber que os dias em que não vais trabalhar por teres um acidente em serviço são descontados na tua avaliação!

– Ó Doutor, assim até apetece fazer greve! Ao menos podemos fazer isso, não podemos?

– A greve é um direito, mas quantos mais dias fizerem mais se desconta na tua avaliação…

– Então o Zé e o Artur andam por aí em reuniões sobre o sindicato, também descontam?

– Esses não! É diferente! Esses teus colegas estão a exercer atividades sindicais e, por isso, esses dias não lhes são descontados na avaliação.

– Ó Sr. Doutor, a conversa já vai longa e eu não estou a perceber a lógica destas faltas! O Sr. Doutor tem a certeza que isto tudo é legal?

– É assim, Silva! Quem lá está em cima é que manda!

– Estou a ver que sim, mas cá para mim, manda mal. Mas, e aquele objetivo dois, que é o das propostas, posso escrever, até porque é da minha área, que era melhor colocar mais pessoal nas ruas para haver mais limpeza?

– Ó Silva, isso acarreta despesas! Deixa lá isso…

– A minha Maria trabalha nas escolas e está sempre a dizer que os professores e os alunos apagam os quadros com uns panos muito sujos. Ela não poderia propor que comprassem apagadores?

– Então, Silva? Mais despesas?? Olha, assina mas é a papelada.

E lá assinou o Silva. Afinal, bem ou mal, quem está lá em cima é que manda…

 

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