Gonçalo Serras lança “You are so beautiful to me”, canção dedicada à irmã que partiu recentemente.
A acompanhar a canção, Gonçalo escreve: “Aqui está a minha nova canção, dedicada à minha irmã, a que gostaria de acrescentar algumas palavras: Já enfrentei muitas vezes a escuridão. Ela aparece sempre, mesmo em momentos felizes. Quando fui campeão de hóquei, há muitos anos, ela estava lá. Entre os choros e os risos de alegria e o abraço do meu pai. Quando terminei o curso ela estava lá, entre as felicitações de colegas e família. Ela estava lá, na confusão do primeiro beijo. Esteve lá também, em todas as canções que compus até hoje. É aquela sensação, que mesmo vencendo, poderíamos ter feito melhor. Ou tendo feito o melhor possível, que não foi o suficiente. Ou ainda talvez, que não mereçamos o que de bom nos acontece. Mas uma coisa eu descobri, o que proporcionou a tranquilidade possível aos dias de hoje. Na maior escuridão há sempre uma luz. E nessa luz há algo de belo. E de puro. E de simples. Há sempre algo que resiste quando a esperança se extingue. Não sou só eu que o digo. Existem muitos relatos de sobreviventes que reforçam a minha experiência. Nas minhas canções tentei sempre captar alguma dessa luz que me move que sinto em mim, mas nunca consegui verdadeiramente. Não sei muito bem o que chamar a essa luz, que é precedida por um silêncio. Como se nesse silêncio germinasse o futuro. À medida que vamos vivendo, vamo-nos apercebendo como cada um tem a sua escuridão, que normalmente está por detrás de medos, receios, vulnerabilidades. Ninguém tem verdadeiramente a culpa disso. Nascemos assim. Fomos feitos assim. Quando me apercebi disso, percebi que não estava só. Percebi que cada um tem a sua escuridão e a sua luz interior. Somos como náufragos convencidos que estamos em terra firme. Muito por culpa das ilusões. Muito por culpa de uma cultura global que fabrica sonhos para que os possamos perseguir, mesmo que para isso tenhamos que esmagar, destruir e assassinar tudo o que nos aparece pela frente. Talvez o maior momento de crescimento da minha vida tenha sido quando abdiquei dos sonhos que tinha. E tinha muitos. Percebi que esses sonhos não eram verdadeiramente meus. Alguém os tinha posto lá. Tive de reinventar as minhas expectativas, os meus anseios, e conformar-me – sim conformar-me – com as minhas limitações. Não vou ser o Nat King Cole – não possuo o a intensidade e doçura da sua voz. Não vou ser Ernest Hemingway – apercebi-me duramente disso da primeira vez que tentei escrever um livro. Não vou ter uma vida fantástica, cheia de emoções e adrenalina. Na verdade, aprendi a viver o melhor possível com os estímulos que tenho, que não têm nada de muito romântico ou carismático. Quando percebi isso, pude finalmente ter noites de sono tranquilo. Dormir em paz. Sabendo que os sonhos que persigo hoje estão verdadeiramente ao meu alcance. Como acordar de manhã e beber um bom café. Como dar uma caminhada, e sentir cada passo que dou. Como ter uma conversa com amigos, e valorizar cada palavra, cada sorriso, cada cara de espanto como se fosse a última vez que os vamos ver. Uma noite tranquila para todos, e que todos possam sempre encontrar a sua luz na escuridão. E verdadeiramente vos desejo: bons sonhos”.