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A notícia da colocação de placas de granito cinzento no bucólico e pitoresco Largo Heitor da Silveira, junto ao Monumento de Camões, está a causar algum burburinho e apreensão na Vila de Constância. Havendo já figuras locais, de quadrantes diversos, a falar na eventual criação dum movimento de cidadania de protecção do centro histórico. São vários os argumentos contestatários. Desde logo, a substituição dos tradicionais seixos dos rios, por materiais completamente estranhos à região e ao centro histórico. Não menos envolta em polémica foi a atribulada adjudicação desta obra que muitos vêem como desnecessária e que não teve em conta nos relatórios de processo a intervenção dos arqueólogos (a adjudicação não obteve sequer o voto favorável da oposição). Sabendo-se da previsibilidade de achados arqueológicos (não há muitos anos foi ali perto encontrado, por exemplo, um machado do Neolítico), o mais prudente seria uma intervenção preventiva no local, ainda que o novel presidente venha argumentar com a não remoção de terras… argumento extemporâneo e que lhe segredaram ao ouvido. Eles só não removem terras, mas em público, de resto, sabemos bem o que a casa gasta (o exemplo das intervenções na Praça serve para calar a boca à edilidade).

Esta zona do Largo Heitor da Silveira, topónimo que homenageia o poeta amigo de Camões com origem na Vila, corresponde a parte da antiga “Rua Grande” onde se situariam as “Portas da Vila” na opinião do antigo cronista Isidoro Gomes. Ali bem perto ainda existem restos de um portal medieval (mal tratado nos anos 90). Havia um túnel e um arco , acaso citados pelo mesmo ilustre conterrâneo pai do escritor e poeta Elviro da Rocha Gomes. Nos anos 60 apareceram no Largo Heitor da Silveira, vestígios de antigas ruínas, o que bem ouvi a uma saudosa idosa, Gracinda Moleiro.

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Mas não percamos o fio à meada…

Este actual presidente tem já um historial de relaxamento nestas matérias e não podemos “franquear as portas”. Recordo aqui, a título de exemplo, a intervenção no Largo Cabral Moncada em que só após contestação pública nas redes sociais, lá se decidiu por contratar um arqueólogo e isto “tarde e más horas”. Muita da terra e sedimentos neste caso terá ficado irremediavelmente mal tratada do ponto de vista da arqueologia. Quando o técnico chegou, já nada poderia fazer de relevante.  Até o forno de cerâmica do século XVII mandou esconder. Relatório??! Adiante. Foi também este presidente da câmara que mandou fazer escavações não controladas por arqueólogos na zona inferior da chamada “Torre”, por causa do colector de esgotos cujo tubo sobre o Tejo (que faz a ligação à ETAR da CAIMA – a CAIMA, sempre a CAIMA) vertia os dejectos para o rio.  Meses a fio.

Com alguma frequência temos assistido a alguma incúria na preservação e defesa  de elementos  característicos da Vila de Constância.  Debaixo da tolerância do novo edil. São vários e flagrantes os exemplos de degradação de ruas,  becos, pavimentos, muros, escadas, que debaixo de sucessivas promessas pessoais deste autarca, não vêem contudo, solução à vista. Olhe-se para a Rua de Santa Ana que se encontra abrangida pelo plano de protecção e salvaguarda do centro histórico. Há muros prestes a abater e escadas com muitas fendas. Um manifesto desrespeito para com as pessoas com mobilidade reduzida. Em terra de cegos, quem tem olho é rei. A evitável “requalificação” do Largo Heitor da Silveira que este presidente “justifica” com os direitos dos cidadãos com mobilidade reduzida, afinal, não o será, em toda a linha. Onde estão essas pessoas e essas barreiras arquitectónicas? Os idosos que frequentam a ancestral Rua de Santa Ana, a caminho da Matriz? Aí já não se aplicam os seus direitos?

Nesta maré de obras de fachada não há espaço para um olhar comunitário? O espaço é paisagem e nele entram os viventes. A estética não é propriedade de um ou dois arquitectos que vivem do experiencialismo autista. Faz-se tudo no segredo dos deuses e depois anuncia-se o resultado final dando-se ênfase ao ângulo politicamente mais  conveniente. Dá-se a coincidência cósmica deste Largo Heitor da Silveira dar acesso directo ao novo museu dos rios que o actual presidente lá consegui desbloquear (pena é que nem sempre o seu partido tenha defendido  a sério o novo museu nos vários fóruns de gestão de candidaturas). Diz ainda o autarca – como se vê colhemos argumentos dos dois lados- que este espaço vai ficar para rede viária e como uma espécie de transição anterior da Praça. Esta argumentação não é dele. É criação do arquitecto. Aqui  entra a estética.  Percebe-se que a decisão não respeitou a cultura colaborativa. Que dirá a burocrática DGPC?

São todos bons rapazes…

José Luz (Constância)

PS- AOLP

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