Do Bloco de Esquerda recebemos o seguinte comunicado:

A deputada municipal Maria do Céu Carvalho (BE) proferiu uma intervenção na sessão solene da Assembleia Municipal, no aniversário do 25 de abril. No entanto, lamentavelmente e à semelhança das intervenções de outros partidos, a intervenção do Bloco de Esquerda não foi transmitida pela internet pelos serviços municipais. Esse “privilégio” apenas foi reservado às intervenções proferidas na mesma sessão pelos presidentes da Câmara e da Assembleia Municipal, ambos do PS.

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O Bloco de Esquerda reprova este tratamento discricionário e antidemocrático.

Transcrevemos na íntegra a intervenção em nome do Bloco de Esquerda, cuja difusão através da internet não foi proporcionada.

“Em nome do Bloco de Esquerda saudamos os militares que, em 25 de abril de 74, desobedeceram à hierarquia e desencadearem um golpe libertador contra o regime fascista. Pelas portas abertas dessa madrugada de abril, irrompeu um poderoso movimento popular revolucionário que, em poucos meses, derrubou muros e impôs profundas transformações na sociedade portuguesa.

Cada passo no sentido da Liberdade e da Democracia foi arrancado à custa de muita luta. Antes e depois de abril de 74.

O fim da guerra colonial foi uma das conquistas mais marcantes. A Paz foi uma conquista de abril.

Infelizmente, hoje a guerra volta aos nossos horizontes, com a criminosa invasão da Ucrânia, por parte da Rússia — com o seu atroz cortejo de morte e destruição. Daqui manifestamos a nossa profunda solidariedade com o povo ucraniano e com a sua resistência nacional à agressão.

Sabemos bem que a paz não passa por escaladas armamentistas acirradas por disputas entre blocos políticos, económicos ou militares.

Aliás, a nossa Constituição, é bem clara, ao preconizar “a dissolução dos blocos político-militares e o estabelecimento de um sistema de segurança coletiva”, perspetiva um sistema mundial igualitário, seguro e de cooperação.

Solidários, acolhemos no Entroncamento várias centenas de ucranianos, entre os quais algumas dezenas de refugiados. Valorizamos muito tudo o que, por imperativo de humanidade, tem sido feito para acolher bem os refugiados. De resto, vêm valorizar ainda mais o carácter cosmopolita da nossa cidade, em que já vivem cidadãos de múltiplos países.

Quando, como em abril de 74, lembramos ser o povo “quem mais ordena” temos de saber ouvir essas vozes tão heterogéneas dos nossos concidadãos. Cumprir o desígnio democrático do 25 de abril exige hoje respostas a este desafio, sob pena de a democracia ceder ao discurso do ódio ao que é diferente, seja pela cor da pele, da etnia, da religião ou, simplesmente, da língua que se usa.

Os discursos xenófobos e racistas, apontando as culpas ao que é diferente para esconder os verdadeiros culpados, encontram terreno sempre que a democracia não responde aos mais fundos anseios populares.

Valerá a pena recordar que o 25 de abril foi feito e a democracia institucionalizada para “promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses”, para usar a fórmula constitucional.

Não é o que está a acontecer.

A austeridade agrava-se com o aumento generalizado dos preços provocado pela escassez de produtos, nomeadamente alimentares, a crise energética e a especulação. A erosão dos salários decorre do crescimento da inflação e da pressão da legislação laboral que favorece a precariedade, sobretudo dos mais jovens, condiciona a contratação coletiva e a atualização dos rendimentos do trabalho.

A necessidade de medidas de combate à especulação nos preços da energia e de bens essenciais coloca-se com urgência. O aumento de 6% este ano no Salário Mínimo Nacional está a ser anulado por uma inflação que já era de 3% antes da guerra e que no final do 1º trimestre já se aproximava dos 6%.

A atualização salarial prevista pelo Governo para a Função Pública situa-se em 0,9%, uma referência também para o setor privado, muito abaixo da inflação, o que determina uma perda dramática de poder de compra dos salários.

Em contrapartida, as empresas do PSI 20 cotadas na Bolsa fecharam 2021 com lucros na ordem dos 3,5 mil milhões de euros e pagaram aos acionistas dividendos recorde. Por imperativo de justiça social e por respeito aos ideais de abril, combater a carestia e o empobrecimento reclama aumentos dos salários e das reformas e pensões que, no mínimo, acompanhem a inflação. Impõe o congelamento dos preços dos bens essenciais e a tributação dos lucros extraordinários e especulativos das grandes empresas da energia e da distribuição comercial.

É preciso garantir hoje o respeito por quem trabalha ou trabalhou. Com os olhos no futuro! Tal passa necessariamente por mitigar as consequências das alterações climáticas também no plano local — seja no desenho urbano, nos transportes públicos ou na política de taxas municipais.

Nos combates de hoje, continuam a valer os sonhos de abril e as vozes da liberdade como a da poeta ucraniana Anna Akhmátova, quando há muitos anos escreveu

Que as novas gerações, tenham paz e vida longa.
As modernas e monumentais cidades,
Em homenagem às aldeias massacradas,
Marcarão o tempo a ferro e fogo.

Estaremos sempre solidários com todas as lutas que defendam a dignidade dos povos e a justiça social.

Com uma certeza: como nas jornadas de abril de 74 só uma ampla mobilização social travará o passo a retrocessos e manterá abertas as portas da esperança.

Viva o 25 de abril! Viva a Liberdade!”

 

26 de abril de 2022

BE – Entroncamento

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