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Com a publicação recente da obra sobre Heráldica familiar nos Concelho de Abrantes e vizinhos, de Paulo Falcão Tavares, assistimos pela primeira vez na historiografia local, a um detalhado inventário de heráldica e genealogia destes concelhos do centro de Portugal.

O livro tem logo como primeiro subscritor (das 169 entidades), o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.  O autor, Paulo Falcão Tavares, explica no seu proémio que «esta será a primeira obra que estuda sistematicamente a temática da heráldica na região mais central de Portugal continental, no seu centro geodésico, a que eu designo doravante por terra tubucense».

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Em rigor, o livro intitula-se «Heráldica familiar nos concelhos de Abrantes, Gavião, Mação, Sardoal, Ponte de Sôr, Constância e Vila de Rei». O autor, acreditado no Instituto Português de Heráldica de Lisboa, é secretário perpétuo da Academia Tubuciana de Abrantes.

Capa da obra ««Heráldica familiar nos concelhos de Abrantes, Gavião, Mação, Sardoal, Ponte de Sôr, Constância e Vila de Rei», de Paulo Falcão Tavares, Academia Tubuciana de Abrantes – 1802, M.M.XXI.

Para se perceber o alcance geográfico do livro, o autor explica que, «na idade média a área geográfica e administrativa de Abrantes, estendia-se até Alter do Chão, Mação e Punhete (actual Constância), sendo um dos maiores concelhos de Portugal, em área».

No interior da obra destacam-se variadas referências ao núcleo heráldico mais importante de Abrantes (e um dos mais relevantes de Portugal), leia-se, o do Panteão dos condes de Abrantes/família Almeida, na Igreja de Santa Maria do Castelo.

«Nós somos o produto daquilo que a história familiar nos proporcionou e pouco mais. Não existe humanidade sem passado», sintetiza lapidarmente o autor, assim tentando desfazer alguns mitos, falsos,  preconceituosos, sobre a importância da heráldica.

Numa sentença bastante assertiva, o autor defende, com propriedade, a saber, que a heráldica é o estudo do brasão. E explica: «O brasão identifica pessoas, famílias, corporações, clubes desportivos, concelhos, países e comunidades internacionais. É um símbolo «falante» e representativo do nosso passado e presente».

A obra agora publicada vem, pois, juntar-se a um acervo de documentos sobre a matéria editados ao longo dos séculos: «Teve esta notável vila, hoje cidade centenária, diversos estudiosos destas matérias ao longo dos séculos: Infante D. Fernando no século XVI, O reverendo padre Jacinto Alvares de Almeida nas suas «notas manuscritas», o Dr Cipriano Pimenta de Mendanha com as suas «Memórias» e, mais tarde, Bernardo Pimenta do Avelar Portocarrero, nos seus volumes genealógicos o qual, no século XVIII, cita os dois anteriores, e que, não procurou investigar mais além de quinhentos, ou do que tinham escrito outros sobre Abrantes e sobre as suas famílias».

É notório o esforço do autor em chamar a atenção do público e das autoridades, mormente, para a importância e concomitante relevância da heráldica, enquanto ciência: «Já desde a antiguidade que os humanos detinham suas marcas de posse fortemente identitárias. A necessidade dos homens em se diferenciarem é marcante, desde o período da ocupação romana no nosso território». Abrantes não terá escapado a essa regra. E, assim, segundo Paulo Falcão Tavares,  «temos diferentes tipos de anéis de abrantinos, com marcas distintas». Segundo refere, foi encontrado um deles, «com um pássaro, corvídeo, inscrito na sua pedra»; na sua opinião avisada, «talvez pertencentes a famílias instaladas em terras de Tubucci, da família de Marcelos, ou outras famílias romanas já aqui nascidas e perfeitamente autóctones».

A introdução desta publicação nos católogos vem, efectivamente, preencher uma lacuna na historiografia local alargada.  Não se pretende aqui nesta peça, é certo, fazer um resumo exaustivo  da obra – o que ultrapassaria a função de um mero texto de opinião. Seria estultícia, porém, não avançar um pouco mais sobre o conteúdo do livro, dada a oportunidade e urgência do assunto e, pode mesmo dizer-se, desabridamente, contrapondo  um certo analfabetismo cultural que mais hodiernamente tem atingido os mais incautos, alheios ao seu passado histórico, aos valores pátrios e aos nossos monumentos (!).

Destarte, o autor pretende, pedagogicamente, alertar as entidades e o público, para a valorização do que ainda nos resta das memórias brasonarias. Para esse efeito, contextualiza as suas asserções, com verdadeira mestria, não fugindo, nunca, aos cânones. E, seguramente, uma obra para a posteridade, académica.

Ainda no período do nosso primeiro rei, conta-nos, temos notícia da Ordem de Santiago: «foi a primeira a ocupar a vila, com sua heráldica própria, logo na primeira dinastia com D. Afonso Henriques. Nas reservas do museu abrantino, existem uns pequenos pratos com a cruz da Ordem de Santiago de Espada, provenientes do Mosteiro das Donas, comendadeiras abrantinas (da Ordem de Santo Agostinho)».

Dom Afonso V «O Africano» criou o título de Conde de Abrantes em 1476. A sua corte, sublinha Paulo Falcão Tavares, «congregou aqui, na zona centro, uma dúzia de famílias relevantes que irão reanimar os concelhos por onde se instalam, adquirindo quintas, promovendo novas formas de olhar o território».

Abrantes terá tido o seu maior incremento «brasonário» com a presença do Rei D. Manuel I na então vila.  Segundo o autor, «não só foram agraciados com novos brasões diversos abrantinos, como a corte residente proporcionou esse mostra artística e documental, sem precedentes».

Do ponto de vista da heráldica, a vila de Abrantes teve três grandes momentos: o manuelino, o Joanino e o Luisino, com as concessões de diversos títulos nobiliárquicos. É esta a conclusão do autor,

Abrantes tem o seu primeiro panteão heráldico-familiar, na Igreja de Santa Maria do Castelo no século XV, destaca-se amiúde  no livro agora publicado.

Sobre o rei D. Manuel I, verdadeiro patrono da ciência heráldica,  Paulo Falcão Tavares, cuja introdução da obra vimos seguindo de muito tempo, refere que o monarca «concedeu armas-novas aos habitantes (de Abrantes, leia-se), por feitos e obras, reconhecendo desta forma o seu mérito. Um pouco como sucedeu com a família Almeida».

A obra heráldica da monarquia na vila terminara por volta de 1890-1910, com a Implantação da República. Por volta de 1918, data da beatificação de D. Nuno Álvares Pereira, surge um renascimento do sentimento nacionalista. O município de Abrantes, sugere o autor do livro, «poderia repor determinadas pedras de armas em casas civis, numa tentativa de valorizar o abandonado centro histórico, em vez de ter os mesmos brasões nas catacumbas húmidas do Castelo-Fortaleza».

Esta proposta de enriquecimento dos imóveis tem, no olhar do historiador, uma plena justificação: «A heráldica faz parte do nosso passado e das nossas memórias colectivas. Foi produzida para ser exposta, não escondida. Enriquecendo os imóveis, enriquecemos a maneira de ver a cidade, valorizando-a para o presente e futuro». É que, mais diz: «A Heráldica deixou de ser uma ciência (apesar de auxiliar) fechada e hermética, através dele podemos identificar acontecimentos, famílias, engrandecendo e descodificando a nossa riquíssima história».

O livro agora dado à estampa teve uma edição limitada de 250 exemplares. O Apoio cultural veio das seguintes entidades: Vila do Gavião, Vila do Mação, Cidade de Abrantes, Paço de Abrançalha, Associação da Família Cunha Coutinho, Academia Tubuciana de Abrantes -1802.  O autor alude ainda a  diversos agradecimentos, por exemplo, à Diocese de Portalegre e Castelo-Branco.

Sobre o Concelho de Constância são tratados apenas temas brasonários alusivos à Quinta de Santa Bárbara e ao Panteão da família Oliveira, na Capela de S. João Batista, actual Mosteiro de Montalvo (Ordem de Santa Clara). O autor, pelo apurado,  propôs ao município a aquisição de 10 exemplares da obra como forma de apoio cultural mas, até ao momento, não terá obtido qualquer resposta, «o que levou a que não investigasse mais sobre o concelho», informou, entrementes.

No livro, afloram-se e fazem-se descobrir aspectos peculiares sobre algumas figuras relacionadas com Punhete (actual Constância), casos da família «Sande», de Dom João de Almeida ou mesmo de Bartolomeu dos Mártires Dias e Sousa (este último,  é sabido, nasceu em Constância em 1806, desempenhou as funções de Director-Geral da Secretaria de Justiça, foi deputado da Junta Geral da Bula da Cruzada e foi várias vezes presidente da Câmara de Deputados.
Faleceu a 7 de Janeiro de 1882 em Lisboa deixando toda a sua fortuna à filha única, casada com o Conde de Tomar). O autor dá à estampa uma foto de um brasão «Sande» acompanhado do necessário comentário genealógico.  Sabemos que esta família tinha sede da administração no Palácio da Torre em Punhete (Constância).

Num outro comentário genealógico, aborda-se o 2º Conde de Abrantes, Dom João de Almeida que foi Alcaide-Mor de Punhete e, sabemos,  assinou o alvará sobre a casa que hoje conhecemos como Casa dos arcos» ou «Casa de Camões».

É da competência material das câmaras republicanas, passo a reproduzir a LAL: « Promover a publicação de documentos e registos, anais ou de qualquer outra natureza, que salvaguardem e perpetuem a história do município», anota-se em atalho de foice…

Em relação aos «Sande» ou «Sandes» (?) vem ao caso recordar que está pendente no município de Constância a resolução em definitivo de um procedimento despoletado pela população,

de classificação das ruínas do Palácio da Torre, como de «interesse concelhio».

 

José Luz (Constância)

PS – não uso o dito AOLP. Sou natural de Abrantes (São João) mais a minha família materna, conquanto tenha sido baptizado e criado  na Vila de Constância.

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