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A Câmara de Constância e a direcção da Casa-Memória de Camões ignoraram estrategicamente o despacho do Ministério Público para que fosse removida a municipalização daquela associação privada imposta pelo presidente socialista do município em 2020. O prazo para regularização dos estatutos e procedimentos junto da Conservatória terminou no dia 15 de Setembro passado. Façamos a história: existe um longo historial de denúncias na Inspecção Geral de Finanças, de autarcas contra autarcas,  desde 2009, sobre a Casa de   Camões. A mais recente denúncia foi feita em 2019 pelo presidente da câmara, contra a Casa de Camões e contra o Centro de Ciência Viva. O jovem autarca veio impugnar diversas verbas transferidas, sem contudo ter informado as duas instituições desse acto marginal / atenta a boa fé contratual. Então, caro jurista, caro autarca? Pacta sunt servanda!

No meio destas querelas mesquinhas partidárias,  do pessoal da aldeia, de luta eleitoral pelo poder autárquico, a associação é, por via dos factos, a mais prejudicada. E eu, porque tive de gastar dois subsídios de vencimento para pagar a advogados e defender a posição do Conselho Fiscal em favor da liberdade de associação. Mas a direcção, oh!,  tem ao seu dispor um advogado avençado municipal que acabou recentemente de ser amnistiado pela Ordem dos Advogados, por alegado conflito de interesses. Um ateu salvo pelo Papa?

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O despacho judicial  de 17 de  Julho de 2023, não poderia ser mais claro:  “Termos em que se convida a associação a proceder a alteração dos estatutos, através de nova escritura pública (precedida de deliberação do órgão de Governo da Autarquia, com competência para tanto, a juntar declaração do Tribunal de Contas concedendo ou dispensando o “visto prévio”, precedida ainda de nova deliberação de Assembleia Geral da Associação autorizando a alteração dos estatutos para que fiquem em conformidade com a Lei) ”. Pior , é impossível.

Empurrando o problema com a barriga, um velho advogado avençado da Câmara  e da associação, tem tentado adiar a questão, por interpostos agentes. Estava marcada para hoje, dia 30 de Dezembro uma Assembleia Geral para uma alteração dos estatutos , cosmética, que apenas incide sobre  questões  insignificantes forma de representar a associação e o destino dos bens em caso de extinção  . Quanto  ao mais grave, nada!

Segundo o despacho judicial e para que conste:

“E no caso concreto:

  1. a) O órgão de Governo do Município é a Câmara, mas a Autarquia é o “Município” daqui que o associado não pode legalmente ser a “Câmara Municipal de Constância/CMC, devendo dizer-se “Município de Constância” (assim respeitando a organização do país, tal como consta dos artigos 235o e 236o, no1 da CRP).
  1. b) Não se refere na escritura de alteração dos estatutos a autorização camarária, da Câmara enquanto órgão de governo do Município ou da Assembleia Municipal conforme o regime jurídico o ditar, à participação na associação (em violação do disposto no artigo 56, no4 da Lei no 50/2012).
  1. c) Não se refere na escritura de alteração dos estatutos o “visto” ou dispensa dele por parte do Tribunal de Contas (em violação do disposto no artigo 56o, no2 da Lei no 50/2012).
  1. d) Atribuem-se nos novos estatutos, à Câmara Municipal de Constância (devendo dizer-se “Município de Constância”) nos artigos 5o, n1, al. b, 7o, no2, 14o, no2 e no3, 16o, al. a) e 22o direitos superiores aos dos restantes associados, seja na integração do Conselho Fiscal, seja quanto às deliberações em si (em violação do princípio da igualdade, uma das vertentes da liberdade de associação – cfr. o artigo 11o da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia no seu artigo 12o, os artigos 13o, 46o, 235o e 236o, no1 da CRP e ainda o Código Civil nos artigos 167o a 184.o).
  1. e) Uma última observação para o disposto no artigo 30o no2 dos estatutos que determina em caso de dissolução da associação a atribuição à associada, Câmara Municipal de Constância, de todo o “ativo líquido e do património da associação” (em violação mais uma vez do princípio da liberdade de associação enquanto ndimensão do princípio da igualdade, especificamente da regra geral constante do artigo 184oCC e artigo 146oss do CSCom).

E como se  não bastasse:

“Há neste momento e com os elementos da escritura e registrais obtidos, erros que implicam a declaração de nulidade das normas ou segmentos indicados (sublinhados), porque se encontram em violação de regras imperativas ”.

Há uma aparente promiscuidade política entre autarcas do Município e da associação. Afinal, todos estão sujeitos a eventual responsabilidade financeira por violação da Lei das Finanças Locais.

Marcaram para hoje uma assembleia para expulsar associados que não respeitem as ordens deliberações sociais.

Método verdadeiramente estalinista  que procura matar a a liberdade de expressão, capturar a liberdade de associação e adiar sine die o problema?

Não deixa ser caricato que a valiosa biblioteca camoniana Victor Fontes tenha sido parcialmente destruída pela chuva… e que os alegados responsáveis continuem no activo.

Desde os anos 80 que  sempre colaborei com a Casa de Camões e com a saudosa fundadora, a escritora e jornalista Manuela de Azevedo. Quer como colaborador, como jornalista, músico ou jornalista que fui.

Ao sair voluntariamente de associado não deixo, contudo, de apoiar a restauração da liberdade da associação.

A luta continua!

José Luz

( Ex- Presidente do Conselho Fiscal e ex – associado da Casa de Camões)

PS [G1]  – A Lei das autarquias locais permite subsidiar as associações, de acordo com um regulamento municipal. Nada obriga a que um município tenha de ser associado. Os actuais autarcas apenas estão a “tentar salvar a pele“ e a colar-se  ao nome valioso  de  Camões. Ignorando o despacho judicial  e desafiando a justiça, os autarcas socialistas aprovaram recentemente mais um contrato-programa superior a 21 mil euros.

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