Dizem-nos que a modernidade começou nos fins do século XV. A humanidade começava a ter esperança no espírito humano esclarecido. A ideia-força que se ia criando, a crença na ciência materialista, na Razão laica e no avanço da técnica confirmavam a lei do progresso irreversível.
Pura ilusão. Já nos finais do século XX, percebíamos que a modernidade agonizava. Já não acreditamos no progresso indefinido do espírito humano enunciado por Condorcet. Quem acredita no sentido ascensional da evolução biológica revelado por Lamarck e Darwin? O que pensar da lei dos três estados de Auguste Comte? Afinal, quando é que a Humanidade atingirá a idade racional? O “socialismo científico” de Marx acreditava na lei histórica determinadora do advento da sociedade sem classes, isto é, sem exploradores nem dominados.
As guerras mundiais do século XX, as guerras da Coreia, Vietname, Nigéria, Afeganistão, Iraque, Líbano e a guerra israelo-árabe, entre outros focos de violência, deitam por terra toda a ideia-força da modernidade e alimentam o exibicionismo e o egoísmo daqueles que não se importam com o seu vizinho. O futuro torna-se incerto. A Humanidade também comporta em si o gérmen da maldade. A violência, a mentira e o orgulho maléfico aguardam sempre o melhor momento para se manifestar. Quando o Iraque invadiu o Kuwait, a invasão foi considerada pelo ministro dos Negócios Estrangeiros soviético, E. Chevardnadze como “um ato de terrorismo contra a nova ordem mundial”. Então!? Que dizer da invasão bárbara perpetrada contra a Ucrânia pelo “czar” Putin?
A História repete-se, agora com outros atores. Parece que o Presidente Russo quer restaurar o mapa político-estratégico da Europa, nomeadamente a Leste, que existia antes de 1983. Nova ilusão. Para tal, está disposto a invadir, destruir, causar medo, sofrimento, morte, sangue e miséria. Mas, mais uma ilusão. Desde o surgimento da “glasnot” (abertura) e da “perestroika” (reestruturação) introduzidas por Gorbatchev, as relações Leste/Ocidente jamais voltariam a ser as mesmas. As mudanças que se seguiram foram tão radicais, como as que levaram `a queda do Muro de Berlim, ao fim de regimes totalitários e à implantação de regimes pluripartidários.
Parece que o Presidente Putin tem dificuldades em perceber a História. A Polónia, a Hungria, Bulgária, Roménia, Áustria, Jugoslávia, Ucrânia, procuraram novos caminhos de progresso e prosperidade, através de reformas significativas e transformação da economia através de relações de mercado. Deixaram de acreditar na auto- intitulada democracia do partido único, percebendo que era possível experimentar os caminhos da democracia pluralista, da liberdade e da felicidade.
Este é o problema. O Presidente Putin não quer que os Ucranianos vivam segundo os valores do Ocidente, entrando para a U.E. e fazendo parte da Nato. Pensa impedi-lo recorrendo à guerra. Nova ilusão. Em 1989, o comunismo sofreu uma clamorosa derrota. Os povos que viram negado o direito à sua própria identidade, que se viram invadidos, reprimidos, despojados das liberdades fundamentais e espoliados do direito de escolher, a partir dessa data sentiram-se impelidos e a cobiçar o êxito económico do Ocidente e a querer experimentar o nível de vida e de bem-estar atingidos pelos países democráticos e, nomeadamente, por aqueles que fazem parte da U.E. Como tal, desejar restaurar o império que existia antes de 1989 é uma fantasia.