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Com alguma frequência leio comentários na internet sobre os versos da canção XII atribuída a Camões, «Oh Pomar venturoso», gravados no monumento em Constância, de Lagoa Henriques. Naquela canção o poeta cantará a confluência da ribeira de Pêra com o rio Zêzere. Dizem os cibernautas que se trata de um erro pois Camões se estará a referir a Pedrógão Grande e não a Punhete (Constância). É velho o argumento. E é fácil desmontá-lo. Não se trata de erro nenhum. A inscrição do monumento a Luís de Camões de versos desta canção tem um fundamento. Leia o presente artigo e perceberá porquê. Já quanto ao facto do poeta não se ter referido ao «rio» (Zêzere) e ao Tejo na lírica, na fase do dito desterro, não concordo com essa conclusão. Por vários motivos. Um, desde já, posso adiantar. Na elegia do desterro o poeta queixa-se aos rios (na versão que o Visconde de Juromenha publicou). Mas essa é outra linha de investigação…

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Camões, um poeta de absoluta modernidade que se encontra sempre à nossa frente. Empossado o Governo, debaixo de citações camonianas, repostos o escudo e esfera armilar no devido sítio, resta-nos aguardar pelo programa das comemorações dos ditos 500 anos do nascimento de Camões. Certa parece ser a escolha de Pedrógão Grande para as comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas (eventos do dia 10 de Junho). A confirmação, segundo a Lusa, aconteceu recentemente numa reunião preparatória com autarcas da CIMRL – Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria, por parte do Chefe da Casa Civil. Aguarda-se o programa oficial.

Jorge de Sena já dizia no seu ensaio “Camões: o poeta lírico”: “Se pouco sabemos de Camões, biograficamente falando, tudo sabemos da sua persona poética, já que não muitos poetas, em qualquer tempo transformaram a sua própria experiência e pensamento numa tal reveladora obra de arte, como a poesia de Camões é».

Curiosamente, decorreu em Pedrógão Grande, em 1995, uma extensão do III Fórum Camoniano comemorativo do quarto centenário da primeira edição das «Rimas várias», de Luís de Camões. A iniciativa do Centro Internacional de Estudos Camonianos da Associação da Casa-Memória de Camões de Constância contou, por exemplo, com a colocação de uma placa com excertos da Canção «Oh Pomar venturoso» em que, de

maneira quase excepcional, se descreve a paisagem da confluência da Ribeira de Pêra com o Zêzere. É a famosa canção XII que alguma crítica literária atribui a Camões. O III Fórum Camoniano foi aliás das escassas iniciativas nacionais a assinalar a efeméride da edição da lírica. E contou com a prestimosa colaboração de docentes ligados às Universidades de Coimbra, Lisboa e Açores. Rita Marnoto (Coimbra), Comissária designada para o V Centenário de Camões era uma das docentes do III Fórum Camoniano em 1995 que decorreu essencialmente em Constância.

A Canção «Oh Pomar Venturoso» tem ocupado a crítica ao longo dos tempos. Na edição das «Rimas», de 1595 (primeira colectânea da obra não-épica de Camões) , apresentava-se ao público apenas as dez canções do poeta ditas autênticas. Nessa edição foi prologador Fernão Rodrigues Lobo Soropita. Jorge de Sena, na sua monumental obra «Uma canção de Camões», refere-se a Soropita, «poeta por mérito próprio», que por cautela defendia desde logo aquela edição, de eventuais acusações de descuido, «numa afirmação de princípios de uma correcta e prudente crítica textual», segundo o juízo avisado de Sena. Três anos mais tarde, Estevão Lopes, usando do seu privilégio, reeditou a colectânea tendo corrigido «erros». Mas daí não resultou a aparição de mais nenhuma canção, como é sabido.

Em 1668, António Álvares da Cunha, numa nova colectânea (terceira parte das rimas), incluía mais quatro canções, três da quais tinham sido publicadas como anónimas na Miscelânea (1629), de Miguel Leitão de Andrada. É aqui que surge a Canção «Oh Pomar venturoso» e a possibilidade da autoria camoniana (a obra de Faria e Sousa tratou do assunto, mas é de edição posterior, apesar de ter sido escrita antes de Álvares da Cunha). Em 1996 encontrei na Biblioteca Municipal de Santarém, Braancamp Freire, um exemplar desta obra contendo entre outros o seguinte comentário: «As três canções seguintes andam com muitos erros impressas nas Miscelâneas de Miguel Leitão, é certo serem de Luís de Camões, como se colhe de alguns manuscritos a quem seguimos, e com quem as emendamos». E segue-se a canção «Oh Pomar venturoso».

Mas havia mais novidades: «Leitor. Convido-vos neste volume, com os versos, que ainda não vistes do nosso grande poeta Luís de Camões, que os trabalhos dos estudos nos trouxeram à mão, de vários manuscritos, muitos da letra própria do Autor. Pouco hei mister para vos fazer crer esta verdade, porque eles mesmo testemunham quem os fez (…)».

Na edição póstuma de Manuel de Faria e Sousa, de 1685-88, revela-se uma canção mais, de cuja autenticidade, o próprio não estava convencido. Um pormenor ressalta à vista num comentário de Sena sobre Faria e Sousa «quanto o está (convencido, leia-se), ainda que relativamente, da das três que Miguel Leitão publicara». Com o Visconde de Juromenha, edição de 1860-69, o número das canções aumentou.

É aí que nos diz: «Se a canção XII é do poeta alguma vez dirigiu as suas excursões até o Pedrógão pois n’esta canção nos descreve uma visita ao convento que os dominicanos tinham naquele sítio junto às margens do Zêzere, e talvez fizesse a visita instado por Miguel Leitão de Andrade, fidalgo ilustre e rico proprietário deste sítio, aquele mesmo que depois lhe pôs um epitáfio junto à sua sepultura».

Na Écloga II, o pastor Agrário diz a Almeno, ao vê-lo chorar as suas desditas de amor: «Todos os teus amigos e parentes/Que lá da serra vêm por consolar-te/Sentindo na alma a pena que tu sentes/Se querem de teus males apartar-se». Camões teria parentes na zona de Coimbra. Viriam à Serra, em Pedrógão Grande? Estando em Punhete (Constância), Camões (Almeno) seria visitado pelos parentes «lá da serra»?

A crítica literária inclina-se para aceitar a autoria camoniana.

Esta canção foi atribuída por Carolina Michaelis de Vasconcelos a Miguel Leitão de Andrade. O médico e literato Adriano Burguete contestou o caso, «utilizando com muita proficiência o processo estilístico comparativo» nas palavras de Maria Clara Pereira da Costa (Obra «Casa de Camões em Constância, 1977). E Jorge de Sena, mais recentemente, utilizando método mais moderno concluiu que «a priori quanto às características estruturais da forma externa, não é possível excluir a hipótese da autoria camoniana».

O poeta de «Metamorfoses» procedeu a uma interpretação estrutural da canção camoniana, precedida de um estudo geral sobre a canção petrarquista peninsular. E ainda sobre as canções e as odes de Camões, envolvendo a questão dos apócrifas. E concluiu sobre Camões: «A sua preferência pela canção, em relação aos seus contemporâneos portugueses, é mais uma prova da centralidade das canções na lírica camoniana».

Na geração do nosso poeta a situação não seria muito mais brilhante do que anteriormente: «Quanto à forma canção. Só Diogo Bernardes terá acompanhado Camões nas suas aventuras com aquela forma, se bem que o não tenha feito em termos tão amplos e tão profundos como os que Camões aplicou», defende.

Sena diz que antes da geração de Camões e, malgrado , leia-se, « o conhecimento incompleto e fragmentário, além de incerto, das obras de quase todos esses homens», pode-se afirmar, em princípio, que a canção não foi praticamente cultivada pelas três gerações literárias que precederam a do nosso vate: Não as têm Bernardim Ribeiro (este, constituiu o primeiro grupo geracional com Sá de Miranda, e tem duas dedicadas à Virgem nossa Senhora). Não as tem o segundo grupo, constituído pelo duque (1º duque de Aveiro, D. João de Lencastre, neto do rei D. João II) ou o infante (Infante D. Luís, filho do rei D. Manuel I). Não as tem o terceiro grupo, por Cristóvão Falcão (?), e Francisco de Sá de Meneses (terá uma apenas).

Sena diz também que as três canções comuns a Faria e Sousa e a Álvares da Cunha foram aceites pelo erudito Storck. O alemão aceitara, embora com reservas a canção «Oh Pomar venturoso».

Tal como referia Maria Clara Costa, Sena usou um método próprio, mais moderno, aliás, tendo sido criticado internamente pela «ousadia». Assim, fez uma análise comparativa procurando concluir da conformidade relativa das canções ditas apócrifas à luz do inquérito estrutural das canções «canónicas».

Para o caso, escolheu canções com commiato (parte final, pequena estância/comentário do texto), a saber: «Oh Pomar venturoso» (1668); «Quem com sólido intento» (1668); «Qu’é isto? Sonho? Ou vejo a Ninfa pura» (1668); «Crescendo vai meu mal de hora em hora» (1861).

Que concluiu, para estas quatro canções, considerando a comparação de que foram objecto, em relação ao cânone das dez canções aceitas? «Que nos permite concluir, sobre a apocrifia, o inquérito estrutural à forma externa delas? Que, a priori, quanto às características estruturais da forma externa, não é possível excluir a hipótese de autoria camoniana das duas canções «Oh pomar venturoso» e «Quem com sólido intento», que se conformam mesmo a parâmetros canónicos tão peculiares com os índices da estrofe e do commiato, e a variabilidade total».

Justino Mendes de Almeida, então Reitor da Universidade Autónoma de Lisboa, também pesquisou sobre o assunto, tendo revelado um dado novo antes da sua exposição no III Fórum Camoniano: «Antes de começar a minha exposição sobre um aspecto específico das Rimas camonianas, as Odes, é justo que se evoque o nome de Miguel Leitão de Andrade, ou Andrada, natural de Pedrógão, contemporâneo e admirador do poeta Luís de Camões».

Diz Justino Almeida que Leitão de Andrade teria mandado colocar, segundo o testemunho de Frei Fernando da Soledade, cronista franciscano, autor da Crónica Seráfica, confirmado pelo Livro de Diogo Mouro de Sousa, manuscrito da Biblioteca da Ajuda, mormente, «um epitáfio em louvor do Poeta, ao lado daquele que lá mandara pôr D. Gonçalo Coutinho, tão conhecido».

O texto de Leitão de Andrade diria assim:

«O grão Camões aqui jaz

Em pouca terra enterrado;

Nas terras tão nomeado,

De espada tão eficaz

Quanto na pena afamado».

 

E nos lados estes dois epitáfios:

Miguel Leitão d’Andrade

Gratitudinis ergo posuit.

e

Ordinarii sub censura permissu et d. patronorum.

Nota o então Reitor da UAL que, «se no segundo epitáfio se declara que houve censura do Ordinário e autorizações dos Superiores para a colocação dos versos de Andrade na sepultura de Camões», no primeiro, contrapõe, «declara-se que Andrade o fez gratitudinis ergo, em «sinal de reconhecimento»».

O vocábulo gratitudo, explica, «que não é do latim clássico, vem já registado no dicionário quinhentista de Jerónimo Cardoso».

Não há dúvida para Justino Almeida de que «a admiração de Leitão de Andrade por Camões está também comprovada em diversos passos da Miscelânea do Sítio de Nossa Senhora da Luz do Pedrógão Grande» mas, com o terramoto de 1755, sublinha «perdeu-se o monumento epigráfico que, tal como referiu, Leitão de Andrade mandara colocar na sepultura de Camões na igreja do Mosteiro de Sant’Ana». Ora, o professor pensa ter encontrado um testemunho, embora indirecto, dessa homenagem de Leitão de Andrade ao Poeta: «Ao ler o artigo de Brito Rebelo, «Miguel Leitão d’Andrade. Apontamentos biográficos e testamento», publicado 2, p. 12-19, do Archivo Histórico Portuguez, vejo no documento nº XIV uma notícia a que atribuo grande interesse». O documento a que se reporta é sobre uma diligência feita sobre as casas de Leitão de Andrade, num auto de vinte e seis dias do mês de Abril de mil e seiscentos e trinta, na cidade de Lisboa, lê-se ali, «nas pousadas de Miguel Leitão de Andrade morador na rua direita que vai da calçada de Santa Ana para a dita igreja donde eu escrivão fui com o padre Gonçalo Pereira procurador do tombo de sendo presente o dito Miguel Leitão o requeri e notifiquei». Assinam o procurador do tombo – Luís de Moura – Gonçalo Pereira.

Portanto, Leitão de Andrade era morador na Rua Direita que vai da Calçada de Sant’Ana para a dita sua igreja. «Ali terá visto, por mais de uma vez, a homenagem de D. Gonçalo Coutinho e ali também mandou, com autorização eclesiástica, colocar a sua homenagem gratitudinis ergo. Que gratidão? Quem sabe se por Camões lhe ter feito a canção «Ó pomar venturoso», transcrita na íntegra na Miscelânia, com a alusão abstracta da autoria, «E em louvor deste pomar se fez esta canção», o que não é seu hábito nos demais poemas que transcreve». Muito interessante, a perspectiva do professor Justino Mendes de Almeida, a quem devo muito nestas matérias.

«Camões e o Convento de Nossa Senhora da Luz, em Pedrógão Grande», foi a exposição que coube a Maria Cristina Neto, da Associação dos Arqueólogos Portugueses, falecida recentemente. O texto apresentado em Pedrógão Grande integrou-se numa extensão ao III Fórum Camoniano comemorativo do quarto centenário da primeira edição das Rimas e acompanhou a colocação de uma placa com excertos da Canção «Pomar venturoso» em que, de maneira quase excepcional, se descreve a paisagem da confluência da Ribeira de Pêra com o Zêzere. A iniciativa contou com o apoio da Câmara Municipal de Pedrógão Grande.

Diz Cristina Neto que «por desejo do povo, em consequência da actuação de um conterrâneo, Frei João Domingues, da Ordem dos Pregadores», resolveu fundar-se um convento com esta invocação, em conformidade com a Breve de 28 de Dezembro de 1475. Os terrenos foram oferecidos por João Rodrigues de Vasconcelos e sua mulher, Dona Branca da Silva, elucida, «com seus pomares, regados de uma formosa fonte de muita, e boa água». A autora recorreu a Frei Luís de Sousa, e à informação de que houve escritura de 12 de Setembro de 1476.

Segundo António Machado de Faria, Leitão de Andrade estudou Português e Latim neste convento.

Pouco restava do antigo convento em 1996, segundo Cristina Neto: «a porta principal e os contrafortes da Igreja, arcos, colunas com inscrições, cantarias, a pedra tumular de Baltazar Aranha de Oliveira, já estudada (…) e os ossos humanos encontrados durante as obras realizadas nos anos 80 e estudadas pelo Dr. Luís Lopes e por mim própria, bem como um manuscrito setecentista ainda inédito, do qual aguardamos divulgação».

Em Maio de 1988 decorreram em Pedrógão Grande, parte das comemorações do IV centenário da Morte de Frei Luís de Granada, promovidas pela Secção de História da Associação dos Arqueólogos Portugueses. Foi quem elevou o convento a noviciado de onde saíram Frei António de Sousa, mais tarde Bispo de Viseu e Frei Inácio de São Domingos.

Do testemunho da antiga arqueóloga retemos ainda e com interesse: «A Senhora Dona Manuela de Azevedo, citando a nossa amiga Dra. Maria Clara Pereira da Costa, confirmou-me que esta investigadora há mais de 20 anos, em companhia do Eng. Themudo de Castro e outras individualidades de Constância, subiu de barco o Zêzere até à confluência com a Ribeira de Pêra. Nessa altura, a Dra. Maria Clara teve oportunidade de ver um livro antigo na Biblioteca Municipal que, segundo informação oral, teria sido pertença do Convento, e no qual se admitia que o futuro autor de «Os Lusíadas» ali passara horas de lazer, frequentando a livraria, provavelmente então rica em clássicos. Isto passar-ser-ia (…) quando da sua presumível estada em Constância, a Punhete de então».

Uma pequena nota de Jorge de Sena, antes da transcrição da canção XII: «Sempre que possível, os textos das canções apócrifas foram conferidos pelas edições ou manuscritos de origem (….) mas sem entrar-se em minúcias de fixação crítica da lição delas (…) Isso não significa que à transcrição não tenham sido aplicados os mesmos critérios que viemos defendendo. Será do maior interesse que, para a sua edificação, o leitor curioso compare, na edição de Juromenha, ou outras, as lições (?) dos textos…».

 

Ó Pomar venturoso (Miscelânea e Terceira parte de 1668)

I

Ó Pomar venturoso,

Onde com a natureza

A subtil arte tem demanda incerta,

Que em sítio tão fermoso

A maior subtileza

De engenho em ti nos mostras descoberta:

Nenhum juízo acerta,

De cego e de enlevado,

Se tem em ti mais parte

A natureza, ou a arte;

Se terra ou céu de ti tem mais cuidado,

Pois em feliz terreno

Gozas de um ar mias puro e mais sereno.

 

II

De teu formoso peso

Se mostra o monte ledo,

E o caudaloso Zêzere te estranha,

Porque olhas com desprezo

Seu cristal puro e quedo,

Que com Pera os teus pés rodeia e banha.

Em ti pintura estranha,

A que Apeles cedera,

Enigmas intrincados,

E mirtos animados

Vemos, que o próprio Escopas não fizera:

Em ti, co’ a paz interna,

Tem o santo prazer morada eterna.

 

 

III

Os jardins da famosa

Babel tão nomeados,

Por maravilha o mundo não levante,

Inda que com gloriosa

Voz, que estão pendurados

Do instável ar a fama antiga cante?

Nem haja quem se espante

Dos famosos de Alcino;

Nem as mais doctas penas

Cantem os de Mecenas,

Cultor de todo o engenho peregrino,

Mas onde quer que voe,

De ti só fale a Fama, e te pregoe.

 

 

IV

Que se era antiguamente

De pomos de ouro belos

O jardim das Hespérides ornado,

E, a pesar da serpente

Que os guardou, só colhê-los

Pode o famoso Alcides de esforçado:

Tu, mais avantajado,

Mostras a uma alma casta

Seguir o que deseja,

Fugir da torpe inveja

(Pomos de ouro que o tempo não contrasta):

Enfim co’a caridade,

Vencer o Inferno, abrir a Eternidade.

 

V

Por tanto da ventura,

Para ti reservada,

Te deixe o céu gozar perpetuamente,

Porque sejas figura

Da glória avantajada

Dele mesmo, e que em ti se represente;

Porque em quanto sustente

O Céu, o Mar e a Terra,

Seus feitos milagrosos,

Mistérios mais gloriosos,

Com que a morte das almas nos desterra,

Por onde em nossas almas

Com que pompas triunfa e com mais palmas.

 

VI

Goza, pois, longamente

Teu venturoso Fado,

Da mãe do teu Autor bem possuído,

Que em ti sempre contente

De seu sublime estado

A alma dos seus alegra, e o sentido.

Cada qual preferido

Nas grandes qualidades

Ao sábio Nestor seja,

Para que o mundo os veja

Exceder as longuíssimas idades,

E com a longa vida

Seja sua memória enobrecida.

 

VII

Canção, pois mais famosas

Por ti não podem ser

Deste monte as estâncias deleitosas,

Bem pode suceder

Que aquele que os teus números governa

Por querê-las cantar te faça eterna.

(Texto de 1668)

José Luz

(ex-presidente do Conselho Fiscal e ex-associado da Casa-Memória de Camões em Constância)

 

PS – Não uso o dito AOLP. Gostaria que cada constanciense pudesse conhecer esta boa polémica da canção «Oh Pomar venturoso» para assim podermos argumentar e defender a tradição literária de Constância de quem o Dr Adriano Burguete foi grande

arauto. A de que o poeta terá feito excursões a Pedrógão Grande por alturas do seu eventual desterro na nossa terra. Há dados soltos que parecem provar uma certa proximidade entre Camões e um grande proprietário de Pedrógão Grande, Miguel Leitão de Andrada, corografista que esteve preso em Alcácer-Quibir. E nós sabemos que de Constância partiram 40 cavaleiros honrados com o Rei D. Sebastião que aqui viveu por diversas vezes (Veríssimo Serrão, Veríssimo José d’Oliveira e o Padre Carvalho da Costa escreveram sobre essas estadias).

Bibliografia principal desta crónica (apesar de haver outras complementares)

Sena, Jorge de. «Uma canção de Camões». Edições 70. 1984. http://arquivo.cm-constancia.pt/viewer?id=986622…

https://arquivo.cm-constancia.pt/viewer?id=986582&FileID=225200

https://arquivo.cm-constancia.pt/viewer?id=986582&FileID=225195

«Lírica Camoniana, estudos diversos». Centro Internacional de Estudos Camonianos da Associação da Casa-Memória de Camões em Constância. Edições Cosmos. Constância-Lisboa, 1999.

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