Recebi há dias em casa um edital camarário através do qual fiquei a saber que se prevê a implantação de uma hamburgaria da cadeia Burger King, num terreno situado a meio da Rua Dr. Francisco Sá Carneiro. Como o alvará em vigor prevê para o local a construção de moradias, é necessário alterá-lo e, daí, o período legal para eventuais pronunciamentos. O que estou publicamente a fazer.
A minha discordância começa pela solidariedade de vizinhança que devo naturalmente aos munícipes que residem na imediata proximidade do espaço em causa, quer em moradias, quer em apartamentos, que serão com certeza confrontados com um quotidiano, previsivelmente agravado em horas noturnas (estes estabelecimentos nunca fecham antes da meia-noite), inteiramente diferente daquele a que estão habituados e a que, digamo-lo, têm direito. Não precisamos de ser especialistas em urbanismo para perceber que uma hamburgaria da dimensão da que se pretende ali implantar terá, de facto, um fortíssimo impacto em toda a vivência da rua, já de si crescentemente sobrecarregada de trânsito. A barulheira e o contínuo cheiro a fritos, mais que previsíveis, não serão uma mera esquisitice preciosa, mas um problema que afetará a qualidade de vida dos residentes próximos e também dos caminhantes que por ali circulam. Acresce que o espaço de implantação me parece exíguo: quantos lugares de estacionamento comportará?
Bem sei que a rua já tem dois supermercados (ambos, apesar de tudo, com muitos lugares de estacionamento, sendo que a edificação do mais recente, precisamente por ser mais recente e por estar junto a um excelente parque desportivo e de lazer, já oferece discussão) e vai ter proximamente um posto de combustível (mais discutível ainda, naturalmente), mas convirá não entrarmos numa lógica de destruição gradual de uma zona urbana, gorando as legítimas expetativas dos moradores e pondo em causa a organização da urbe, que se pretende o mais harmoniosa possível.
Como todos sabemos, e não podemos ignorar, estabelecimentos de restauração massificada, como é o caso, são implantados em zonas bem definidas e destinadas às grandes superfícies. E a nossa cidade tem espaços para isso, por exemplo, na zona norte junto à A23, onde já estão edificados espaços comerciais de grande dimensão.
Não posso deixar de dizer ainda o seguinte. Tenho às vezes passado, por volta da hora de jantar, na estrada que sobe para a hamburgaria McDonald’s, em Torres Novas, e deparo-me com uma fila imensa de viaturas em espera para o McDrive. Imagine-se uma fila de dezenas de carros na Rua Dr. Sá Carneiro (eventualmente uma fila em cada sentido, pois que tem dois), balizada por dois cruzamentos com semáforos, à espera para entrar na hamburgaria…
Não ignoro o investimento e os postos de trabalho que serão ganhos para a cidade, mas também não estou, de forma nenhuma, a defender que se inviabilize a abertura deste espaço de restauração no Entroncamento, independentemente das questões alimentares que se possam aduzir e que têm a ver com as opiniões de cada um. Naturalmente, nada me move contra a cadeia de restaurantes Burger King e muito menos contra o proprietário do terreno.
Posto isto, não esqueçamos que, embora com características acentuadamente urbanas, vivemos numa pequena cidade de província, e isso não é nenhuma fatalidade de que nos envergonhemos, bem pelo contrário. Quanto melhor organizarmos o nosso tecido urbano, o nosso espaço público, melhor viveremos.
Concluo referindo que fui público apoiante do Presidente Jorge Faria nas suas duas candidaturas ao cargo, mas, supondo que está a favor desta alteração, não o acompanho nesta matéria.
Arnaldo Lopes Marques